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Este princípio, concernente à pessoa contra a qual o Estado busca aplicar sanções penais, está previsto, de forma expressa, no art. 5º, LVII, da CRFB/88 nos seguintes moldes: “Art. 5º, LVII. Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
Analisando a origem deste princípio, Rangel (2010, p. 25) comenta:
O princípio da presunção da inocência tem seu marco principal no final do século XVIII, em pleno iluminismo, quando, na Europa Continental, surgiu a necessidade de se insurgir contra
o sistema processual penal inquisitório, de base romanocanônica, que vigia desde o século XII. Nesse período e sistema
o acusado era desprovido de toda e qualquer garantia. Surgiu a
necessidade de se proteger o cidadão do arbítrio do Estado que,
a qualquer preço, queria sua condenação, presumindo-o, como
regra, culpado.
Fora através da Revolução Francesa, e da consequente promulgação da
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789, que o princípio da
presunção da inocência finalmente despontou em uma norma jurídica (RANGEL,
2010). O art. 9º da citada convenção assim estava disposto:
Tout homme étant présumé innocent jusqu’a ce qu’il ait été
déclaré coupable; s’il est jugé indispensable de l’arrêter, toute
rigueur qui ne serait nécessaire pour’s assurer de as personne,
doit être sévèrement reprime par la loi. (Todo homem é
considerado inocente, até o momento em que, reconhecido
como culpado, se julgar indispensável a sua prisão: todo o rigor
desnecessário, empregado para a efetuar, deve ser
severamente reprimido pela lei.)
Mesmo raciocínio foi adotado pela Declaração Universal dos Direitos
Humanos, em 1948, que no seu art. 11, item 1, assim regra: “Everyone charged with
a penal offense has the right to be presumed innocent until proved guilty according to
law in a public trial at which he has all the garantes necessary for his defense”( Toda
a pessoa acusada de um ato delituoso presume-se inocente até que a sua
culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que
todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas.)
Em 1764, Cesare Beccaria, em sua famosa obra Dos delitos e das penas, já
advertia que:
“Um homem não pode ser chamado culpado antes da sentença
do juiz, e a sociedade só pode retirar-lhe a proteção pública
após ter decidido que ele violou os pactos por meio dos quais
ela lhe foi concedida. Qual é, pois o direito, senão o da força,
que confere ao juiz o poder de aplicar uma pena a um cidadão,
enquanto perdure a dúvida sobre sua culpabilidade ou
inocência? Não é novo este dilema: ou o delito é certo ou
incerto; se é certo, não lhe convém outra pena que não a
estabelecida pelas leis, e são inúteis os tormentos, pois é inútil
a confissão do réu; se é incerto, não se deve atormentar um
inocente, pois é inocente, segundo as leis, um homem cujos
delitos não estejam provados” (BECCARIA, Cesare, Dos delitos
e das Penas. São Paulo: Martins Fontes, p. 69).
PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
A incorporação expressa do Princípio da Presunção de Inocência a legislação
nacional, trouxe consigo a dúvida quanto a sua abrangência, se seria de fato o
princípio da presunção de inocência, ou o mais restrito princípio da não-culpabilidade.
No entanto, com a aprovação do Congresso Nacional, pelo Decreto Legislativo nº27
de 1992 e com a Carta de Adesão do Governo Brasileiro, anuiu-se com a Convenção
Americana sobre Direitos Humanos, o Pacto de São José da Costa Rica, que
estabeleceu em seu art. 8º,I o Principio da Presunção de Inocência ao afirmar que:
“Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto
não se comprove legalmente sua culpa”.
Diante disto, o Brasil tem hoje dois textos legais, de valor constitucional que
asseguram tal princípio. Uma vez que o art. 5º, §2º da CF/88 da essa condição de
constitucional ao tratado internacional por esses meios aprovado no país, tanto o
Pacto de São José da Costa Rica, como o art. 5º, LVII da CF/88 reconhecem
integralmente o Princípio da Presunção de Inocência.
O Supremo Tribunal Federal possui jurisprudência pacífica pela aplicação do
princípio da presunção da inocência no ordenamento jurídico pátrio:
O postulado constitucional da não culpabilidade impede que o
Estado trate, como se culpado fosse, aquele que ainda não
sofreu condenação penal irrecorrível. A prerrogativa jurídica da
liberdade – que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI
e LXV) – não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias
ou jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de
conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente,
em detrimento de direitos e garantias fundamentais
proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei
e da ordem. Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta
prática de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença
penal condenatória irrecorrível, não se revela possível – por
efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) –
presumir-lhe a culpabilidade. Ninguém pode ser tratado como
culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja
prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito,
decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio
constitucional da não culpabilidade, em nosso sistema jurídico,
consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público
de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado,
ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido
condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário.
Precedentes. (STF - HC: 89.501/GO, Relator: Celso de Mello.
Data de Julgamento: 12/12/2006, SEGUNDA TURMA, Data de
Publicação: DJe 16/03/2007).
A presunção de inocência é na verdade um estado de inocência, no qual o
acusado permanece até que seja declarado culpado por sentença transitada em
julgado. Logo, o acusado é inocente durante o processo e seu estado só se modificará
com a declaração de culpado por sentença.
A aplicação desse princípio ocorre tanto no campo probatório, quanto no
tratamento de um acusado em estado de inocência. No primeiro caso, o acusado deve
ser presumido inocente, cabendo a parte que acusa provar a veracidade do fato, e a
culpabilidade do acusado. E só depois de sentença condenatória transitada em
julgado, decorrente de processo judicial, é que ele pode ser considerado culpado.
Fonte: Facuminas